Troca de sonetos chulos com Sergio Duarte (Guiar Tedes) – Brasília, 1977/78

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

Busquei fruir os sons de lira altiva

Que às carícias de Tedes ecoara.

Tal era a fama, sim tão bela e rara,

Da ardente musa de seus dons cativa.

 

Agora sei porém, por mais que viva,

Por mais que amargue deste mundo a tara,

Jamais terei de haver-me, cara a cara,

Com tão infame e pífia inventiva.

 

Eu que pensara ouvir sublime hino,

Que do ordinário me elevasse a vista,

De cu em cu vaguei, cruel destino.

 

Mas a verdade, hélas, por fim conquista;

Se toda a merda nasce no intestino,

Vive e morre na mente desse artista!

 

 

DE GUIAR TEDES PARA J.D.

 

“Sátiras prestam, sátiras se estimam

Quando nelas Calúnia o fel não verte”

(Bocage)

 

Não me ofendo, senhor, nem faço caso

De anônimas perfídias e ironias

Quais as vossas perversas porcarias

Que em responder agora me comprazo.

 

As vossas falsidades deram azo

A que eu compare aqui nossas porfias:

Eu falo em gretas doces e macias

E vós falais de cus no mesmo prazo.

 

Em vossos versos demonstrai às claras

Que amais da merda as fedorentas grutas

Que de guarida servem às rijas varas;

 

Mas eu canto, nos meus, conas hirsutas,

Chochotinhas febris, bucetas raras,

De princesas, de fadas e de putas.

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

Justa afronta movera minha pena

Que de estultícias nunca compartilha.

Nem pensara que Musa assim serena

Enxovalhada fosse em vil quizília.

 

Mas se a infâmia é farpa que envenena,

Cumpre exprobrar aquele que a perfilha,

Pois quem de anais pendores me condena

Em merda traça a tenebrosa trilha.

 

A vós – que tanto amais a rima imunda,

O verso chulo, a tara odienta –

Oferto aqui repulsa mais profunda

 

E enfim registro tudo que me alenta:

De fêmea ardente a curvilínea bunda,

O farto seio, a vulva suculenta.

 

 

 

DE GUIAR TEDES PARA J.D.

 

 

Teus sonetos revelam, com malícia,

Inquietações de adolescente afeito

Ao priapismo e às poluções no leito

Disfarçadas com certa pudicícia.

 

Se bundas feminis te causam o efeito

De ejacular sonetos com blandícia

(os piores de que se tem notícia)

Meu caro amigo, já não tens mais jeito!

 

Por Vênus calipígia, que te inspira

Esse teu estro desbocado e cru,

É que atraíste do parnaso a ira;

 

E agora eis o que deves fazer tu:

Dobra, bem dobradinha, a tua lira

E, em seguida, enfia-a no cu.

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

A paciência minha nem é pouca,

Mas não bastante pra calar-me a boca

Quando um parceiro, falto de argumento,

Recorre assim ao mero xingamento.

 

Se minha musa, dizes, anda rouca

E no Parnaso é tida como louca,

A tua atende em lupanar nojento

E só se inspira em sonhos de excremento.

 

Teu verso indica, é Freud quem alerta,

Anais impulsos a que tu não cedes

E em vão sublimas dessa forma incerta.

 

Mas, para um leigo, em tua mente fedes

Qual vazadouro, qual cloaca aberta,

Ó conturbado, ó pobre Guiar Tedes.

 

 

 

DE GUIAR TEDES PARA J.D.

Que a Musa estenda o manto benfazejo

Por sobre a liça, trágica e sangrenta,

Onde Guiar a um poetastro enfrenta

Colhendo glória e louros de sobejo.

 

Da minha lira suja não me pejo

Mas o charco em que vives não me tenta;

Antes, prefiro a reconquista lenta

Da perfeição formal que tanto almejo.

 

Eia, sus, aprendiz tardo e bisonho

Que em vão procuras ouro entre o cascalho;

Recolhe o desafio que te imponho

 

E as penas sofrerás de novo Ordálio

Para glosar o mote que proponho:

“Cus em repouso, e picas ao trabalho”.

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

 

Da ironia a espada mais cortante

Não penetrara a dura carapaça

De quem se crê poeta, mas não passa

De trêfego jogral, cruel farsante.

 

Vós confundis talento com talante

E gentil graça com vulgar chalaça,

Só não encontrareis a menor jaça

Neste meu estro claro e rutilante.

 

Aos cus se dê repouso merecido

Das tenebrosas incursões verbais

Que vossos verbos cantam com alarido.

 

Quanto ao labor das picas, nada mais

Direi para que seja bem ouvido:

Trato da minha – d’outras, vós cuidais!

 

 

 

DE GUIAR TEDES PARA J.D.

 

Por ter estado do Parnaso ausente

Durante muito tempo, faço agora

Nova glosa, com lira mais sonora

E coração mais presto e diligente.

 

Percebo, por teus versos, que somente

De ti próprio te ocupas cada hora,

Sem permitires a ninguém de fora

Cuidados ao teu órgão mais potente.

 

Mais se conhecem os homens, mais espanto

Nos provocam as surpresas do amanhã:

Sei que às vezes sucumbe o monge santo

 

Na cela escura, ao solitário afã,

Mas não te houvera acreditado tanto,

Tão devotado seguidor de Onan.

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

 

No Pentateuco lê-se que Onam

Não praticava o solitário esporte

Por perversão ou distração malsã,

Mas por motivo de ordem bem mais forte:

 

Pois se Tamar lhe vinha pela morte

De seu irmão que não honrara o clã,

Justificado estava, ingrata sorte,

Em derramar ao solo a seiva vã.

 

O bíblico episódio aqui relembro

Pois, na vida, ninguém escapa à bronha

Do ardente maio às cinzas de dezembro,

 

E nada alcança aquele que não sonha.

Mas teu franco fascínio por meu membro,

Hás de convir, é coisa que envergonha.

 

 

 

SONETO AO CARALHO DE J.D.

É um exemplo perfeito de ato falho

E do exibicionismo de um Narciso

Tua crença infantil de que é preciso

Que todos cantem loa ao teu caralho.

 

És como o eunuco à porta do serralho

Da concubina a ouvir lascivo riso

Que a mão leva à virilha e de improviso,

Lamenta a falta ali do rijo galho.

 

Não por primeira vez lhe dou conselhos

Por que o dom da humildade em ti não morra:

Vai ao teu quarto, cerca-te de espelhos,

 

Bate uma bronha, e antes que a seiva escorra,

Vê se o que tens no meio dos pentelhos

Merece o nome arcádico de porra.

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

 

Muitos são os caminhos desta vida –

Vergéis floridos, lúgubres desertos –

E quem garante a hora da partida

Vê que o rumo e a chegada são incertos.

 

Assim lancei-me, d’alma e peito abertos,

Nesta liça a que o estro nos convida,

Muito embora alertassem os mais espertos

Que me aguardava guerra sem guarida.

 

Jamais crera, porém, que em branco e preto

Confrontaria tara tão medonha,

Que de meu pau faz tema de soneto.

 

Cumpre, pois, que a verdade aqui se exponha:

Meu sêmen será sempre, te prometo,

Mais potente que tua vil peçonha!

 

 

 

DE J.D. PARA GUIAR TEDES

 

 

Longínqua soa, já, a voz do bardo

Que outrora ousou brandir lira obtusa

Ante a ponta aguçada de meu dardo

Para sofrer derrota sem escusa.

 

Sedento estou, qual fero leopardo,

Do sangue farto desta vossa musa.

E, como não vos tenho por bastardo,

Jamais contemplarei tíbia recusa.

 

Busco, porém, porfia nobre e sã,

A que não falte empenho varonil

E a necessária nota folgazã.

 

Se retrucardes pois, de forma vil,

No vão apelo à linguagem chã,

Mando-vos logo à puta que o pariu.